A Itália tem lugares lindos a serem visitados além das grandes cidades turísticas. Lugares cheios de histórias, algumas tristes e outras curiosas, que acabam por conferir um encanto maior aos nossos passeios. Foi exatamente em um desses que conheci melhor a história da barragem do Gleno, marco triste no passado dos habitantes da Valle di Scalve e Valle Camonica, bem na região dos Alpes da província de Bérgamo. Amanhã fará 4 meses que estivemos por lá, visita adiada por causa da primavera chuvosa deste ano.
Era um belo domingo de sol e saímos bem cedo de casa para não pegar o calor já impiedoso de junho e para aproveitar melhor a manhã, que costuma ser mais tranquila. Da nossa casa até Pianezza (distrito de Vilminore di Scalve, Bérgamo) dá meia hora de carro e de lá seguimos a pé pela trilha mergulhada na vegetação alpina e circundada de precipícios. O tempo do percurso é estimado em uma hora, mas como não sou muito treinada para subidas e parava sempre para tirar fotos, levamos um pouco mais.
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O início da trilha |
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Quase na metade do percurso. O senhor da frente, de 70 anos, estava mais em forma que eu e ainda faz a caminhada pelos menos duas vezes por ano |
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Quase chegando. Tem um precipício do lado direito da foto |
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Os restos da barragem |
Todo o esforço, porém, valeu a pena. O planalto do Gleno, situado a 1500 metros de altitude, proporciona um belo panorama dos Alpes e das pequenas cidades situadas no Vale de Scalve. É um local ideal para praticar excursão ou skyrunner (corrida na montanha), relaxar à sombra de um pinheiro, tomar um solzinho à beira da torrente ou se deliciar com um piquenique, tudo ao ar livre e puro da montanha.
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O lago do Gleno. É nessa área que surgia a represa |
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Alpes da Valle di Scalve |
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Marmota, um dos habitantes locais |
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Torrente Gleno. A água estava tão gelada que era quase impossível se refrescar nela |
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A torrente Gleno que desemboca no lago. Logo mais adiante, os restos do açude |
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As ruínas da barragem do Gleno vistas da parte interna. Quando ela existia, o local onde tirei a fotografia era todo cheio de água |
Mas não é só pelas belezas naturais que o planalto do Gleno é conhecido e meta dos visitantes. As ruínas da antiga represa lá presentes testemunham um trágico fato que mudou a vida da população local.
O desastre do Gleno
A Itália passava por carestias durante a Primeira Guerra Mundial e a necessidade de energia elétrica leva a empresa Galeazzo Viganò, da cidade de Triuggio (Milão), a realizar uma hidroelétrica para atender à grande demandade de suas fábricas têxteis instaladas na região. Em 1917, o empresário Virgilio Viganò conseguiu a aprovação para a construção de uma barragem na bacia do Gleno, com capacidade para 3.900.000 metros cúbicos.
Virgilio Viganò, homem muito influente que comandava sozinho seu patrimônio familiar, não perdeu tempo e deu início às obras antes mesmo de ser aprovado o projeto. Tinha por ambição uma mega construção nunca antes realizada (constituída por dois tipos de barragens: de gravidade e em arcos múltiplos) em tempo record o que levou, nos seis anos de sua realização, a condições quase desumanas dos operários empregados, a utilização de materiais de baixa qualidade e o comportamente tirânico do grande chefe ante quaisquer reclamações e sugestões. A estas, somam-se também as condições naturais, como a constituição do geológica do terreno e as chuvas abundantes que acabaram por sobrecarregar a barragem.
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Durante as obras de construção no início do século XX |
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A barragem quase terminada e os operários posando para a foto |
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O projeto da obra |
Tudo isso culminou na tragédia que ocorreu na fatídica manhã do dia 1 de dezembro de 1923. O pilão central da barragem, já comprometido por uma grande rachadura, acabou cedendo e os 6 milhões de metros cúbicos de água armazenados foram varrendo tudo o que encontravam pela frente com uma velocidade e fúria aterrorizantes. Nos 30 km de percurso, foram destruídas cidades inteiras, casas, fábricas, plantações, causando a morte de mais de 300 pessoas e a desolação do território.
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O açude do Gleno em 1923 |
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As ruínas hoje (2012) |
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O caminho percorrido pela água durante o desastre |
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Bueggio, distrito do município de Vilminore di Scalve, foi o primeiro povoado a ser atingido pela fúria da água. Foi destruída uma igreja do século XVII, reconstruída anos depois do desastre |
Depois dessa tragédia que abalou a Itália e o mundo (o prefeito de uma das cidades antigidas chegou a receber uma carta da Austrália de um italiano pedindo notícias de parentes), foram aplicadas novas leis mais severas para a segurança das represas artificiais. Infelizmente, parece que tais leis não foram seguidas com rigor, como testemunha outro caso tragicamente semelhante ocorrido em 1963 no norte da Itália: o desastre do Vajont.
Adorei o seu post, que saudades de a ler. As fotos estão lindas, pena que um lugar tão belo esteja associado a uma história trágica assim.
ResponderExcluirObrigada por este momento de partilha e aprendizagem.
Beijos, mil
Ruthia d'O Berço do Mundo
Ruthia, fico feliz com sua visita! Os comentarios dos leitores sao como energia para meu blog :D
ExcluirQuando estavamos chegando às ruinas e vi todo aquele colosso partido ao meio, pensei em tudo o que tinha lido a respeito da tragédia. O bom que a paz que se tem naquele lugar faz esquecer o lado ruim.
Um beijo
Non puoi immaginare la "saudade" che ho leggendo il post e vedendo quelle foto. I luoghi che tu hai descritto, anche se un po' lontani da dove io abitavo, rappresentano il mio mondo. Era un mio sogno vivere in un luogo come quello, ma il destino ha voluto che la mia vita fosse completamente diversa. Accetto il mio destino, ma quello che ho nel cuore solo io posso comprenderlo.
ResponderExcluirAbraços.
Ciao Franco, è un piacere leggere il tuo commento qui.
ExcluirAbito in una valle vicina, la Val Camonica, e anche se è una realtà molto diversa da cui mi ero abituata mi sento come se fossi a casa.
Franco, forse dovresti vivere al sud del Brasile o in qualche paese del sud di Minas Gerais. Ricordano un po' i paesaggi italiani.
Um abraço
La mia idea era proprio quella. Ma se riesci tu a convincere mia moglie....
ExcluirAbraços!
Lindo passeio, belas fotos e uma historia para nao ser esquecida!
ResponderExcluirSuper abraco
Obrigada, Celia!
ExcluirUm abraço para todos voces ai em terras gauchas.
que lugar lindo! Já fiz varias caminhadas em Bergamo e tbm Lecco. tem que ter folego e pique, mas a paisagem vale tudo e qualquer esforço! Presenteei teu blog com um selinho, passe la no sonhos na italia pra pega-lo. bju
ResponderExcluirO que nao falta aqui é paisagem bonita, nao é mesmo? Caminhar em meio à natureza vale sim qualquer esforço.
ExcluirObrigada pelo selinho e por seu comentario! Fico honrada :D
Beijos